
O impacto dos atrasos de pagamento do setor público e como se preparar
Publicado por Ótmow
10/10/2025
O impacto dos atrasos de pagamento do setor público e como se preparar
Fornecer bens e serviços ao setor público é uma oportunidade estratégica para empresas que buscam contratos de médio e longo prazo com estabilidade e segurança jurídica. No entanto, um dos maiores desafios enfrentados pelos fornecedores continua sendo a imprevisibilidade nos pagamentos.
Mesmo com a modernização da legislação, muitos órgãos ainda ultrapassam os prazos contratuais, o que afeta o fluxo de caixa e a capacidade de operação de milhares de empresas em todo o país.
A nova lei de licitações e o que mudou
A Lei nº 8.666/1993 foi revogada em 30 de dezembro de 2023, sendo substituída integralmente pela Lei nº 14.133/2021, conhecida como a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
Diferente da legislação anterior, a nova lei não define um prazo fixo e único para pagamento (como os antigos 30 ou 60 dias).
O artigo 141 estabelece que os pagamentos devidos pela Administração devem obedecer à ordem cronológica de exigibilidade, ou seja, a sequência em que as faturas forem liquidadas. Essa ordem só pode ser alterada mediante justificativa formal e comunicação ao órgão de controle interno e ao tribunal de contas.
Além disso, a Administração Pública deve divulgar mensalmente a ordem cronológica e as justificativas de eventuais alterações, uma medida que reforça a transparência, mas cuja aplicação ainda varia entre órgãos e esferas de governo.
Prazos operacionais: o que a IN nº 77/2022 estabelece
No âmbito federal, a Instrução Normativa SEGES/ME nº 77/2022 fixou prazos objetivos que servem como referência:
- Até 10 dias úteis para liquidação da despesa, a partir do recebimento da nota fiscal;
- Até 10 dias úteis para pagamento, contados da liquidação.
Esses prazos são reduzidos pela metade para contratos de pequeno valor, conforme o art. 75 da própria Lei 14.133.
Entretanto, é importante destacar que esses prazos não se aplicam automaticamente a estados e municípios, cada ente pode editar regulamentos próprios ou definir prazos distintos em edital e contrato.
Na prática, o que prevalece é o prazo contratual, desde que não haja violação aos princípios da razoabilidade e eficiência.
Pagamentos antecipados e ressalvas legais
O artigo 145 da Lei nº 14.133/2021 permite o pagamento antecipado, total ou parcial, em caráter excepcional.
Essa prática é válida somente quando:
- Gera economia comprovada ou é indispensável à execução contratual;
- Está expressamente prevista no edital ou contrato;
- O órgão avalia o risco da operação e, quando cabível, exige garantia adicional.
Na contabilidade das empresas fornecedoras, é importante lembrar que a antecipação de recebíveis não é registrada como dívida tradicional, mas pode gerar obrigação futura caso o pagamento do órgão público não ocorra, exigindo devolução ou ajuste financeiro.
Portanto, embora seja uma ferramenta útil para liquidez imediata, deve ser tratada com planejamento financeiro e jurídico.
As consequências práticas dos atrasos
Os atrasos de pagamento comprometem não apenas o caixa, mas a sustentabilidade do negócio.
Segundo levantamentos recentes do Sebrae, grande parte das pequenas e médias empresas fornecedoras do governo precisaram recorrer a crédito emergencial para manter operações em dia. Essas linhas, com juros que frequentemente superam 25% ao ano, reduzem drasticamente a margem operacional.
Principais efeitos observados no mercado:
- Endividamento: empresas recorrem a crédito caro, elevando o custo operacional.
- Perda de competitividade: juros e dívidas reduzem a capacidade de oferecer preços vantajosos em novas licitações.
- Efeito em cadeia: prestadores e fornecedores secundários sofrem com o descasamento de caixa.
- Risco de paralisação: sem capital de giro, muitos contratos públicos acabam suspensos ou entregues parcialmente.
Em estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), publicado em 2022, 35% das empresas que forneciam a estados relataram atrasos superiores a 60 dias, o que impactou o pagamento a seus próprios fornecedores.
Como se preparar financeiramente para os atrasos
Ainda que os atrasos não possam ser eliminados, as empresas podem estruturar uma gestão financeira preventiva, capaz de absorver impactos e manter a operação saudável.
- Gestão ativa de contratos e prazos
Acompanhe empenhos, liquidações e ordens de pagamento. O monitoramento dos portais de transparência permite identificar atrasos antes que eles comprometam o caixa. - Reserva de emergência
Crie um colchão financeiro equivalente a 2 a 3 meses de despesas fixas, garantindo segurança em períodos de menor liquidez. - Diversificação de contratos
Evite concentrar o faturamento em um único órgão ou esfera. Atuar simultaneamente em contratos municipais, estaduais e federais reduz o risco de inadimplência generalizada. - Antecipação de recebíveis
Converter notas fiscais públicas em liquidez imediata é uma solução cada vez mais utilizada.
Apesar de não configurar empréstimo direto, é fundamental avaliar as condições da operação e a solidez do órgão sacado, pois o atraso no pagamento público pode impactar o retorno financeiro da antecipação. - Planejamento tributário ajustado ao fluxo de caixa
Sincronizar tributos com previsões de recebimento evita recorrer a crédito emergencial em períodos críticos. - Cláusulas protetivas nos contratos
Negocie cláusulas de correção monetária, suspensão de prazos e multa por atraso, conforme permitido pela Lei 14.133, para resguardar os direitos da empresa.
Responsabilização e limites legais
A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000) determina que gestores públicos podem ser responsabilizados administrativa e civilmente se ordenarem despesas sem cobertura orçamentária.
As penalidades incluem:
- Multas e responsabilização pessoal;
- Impedimento de criar novas despesas;
- Inelegibilidade em caso de dolo ou reincidência.
Entretanto, essas punições recaem sobre o gestor, e não sobre o órgão contratante.
Na prática, o fornecedor continua arcando com os efeitos imediatos do atraso — motivo pelo qual é essencial adotar estratégias financeiras sólidas e preventivas.
Conclusão
Os atrasos de pagamento no setor público continuam sendo um dos maiores desafios para quem atua com contratos governamentais.
Com a Lei nº 14.133/2021, o foco mudou: não há mais prazos fixos universais, e sim o dever de respeitar a ordem cronológica e as condições contratuais estabelecidas.
Nesse cenário, a preparação financeira se tornou um fator determinante de sucesso.
Empresas que mantêm reservas, diversificam contratos e utilizam soluções seguras de antecipação de recebíveis conseguem atravessar períodos de instabilidade com mais solidez, transformando o desafio em oportunidade de crescimento sustentável.
Interessado em antecipar com o Ótmow? Faça uma simulação.
Leia também
Ver todoschevron_right
Lei 14.129/2021: Governo Digital e o Impacto nas Licitações
A Lei 14.129/2021, sancionada em 29 de março de 2021, estabelece as diretrizes para a implementação do Governo Digital no Brasil, com o objetivo de modernizar e ampliar a eficiência da administração pública. A digitalização de processos é vista como uma estratégia para melhorar a prestação de serviços públicos, e a Lei 14.129/2021 impacta diretamente […]

O Impacto das Mudanças na Lei de Licitações nas Micro e Pequenas Empresas
A nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 14.133/2021, substituiu as Leis 8.666/1993, 10.520/2002 (Lei do Pregão), e parte do Regime Diferenciado de Contratações (RDC). Esta legislação representa uma reforma significativa nos processos de contratação pública no Brasil, buscando aumentar a transparência, a eficiência e a competitividade, além de promover a participação de […]

O que é Licitação Pública e Como Funciona no Brasil?
A licitação pública é um processo essencial para a administração pública, pois permite que o governo selecione fornecedores para a prestação de serviços e a aquisição de bens de maneira justa e transparente. Ela é regida por leis específicas que garantem a isonomia e a eficiência no uso dos recursos públicos. Neste artigo, exploraremos detalhadamente […]